sábado, 29 de setembro de 2012

Falar ou não a verdade? - Dan Porto


O meio social nos ensina a ser hipócritas, mentirosos, omissos. Tudo isso porque não se pode mais ter defeitos, temos todos que ser bonecos com sorrisos nos rostos e fichas limpas. A verdade, entendida aqui como acontecimento pela ideia de Michel Foucault, manda a regra que jamais pode ser dita, no máximo levemente sugerida no subtexto. Tudo o que importa é manter a imagem de bom moço e sem nunca revelar o quanto custa emocional e psicologicamente manter tal imagem.

Nós estamos morrendo sem ter vivido. O materialismo nos impôs a racionalidade e a negação de tudo o que represente liberdade e verdade essencial. O ser humano evoluiu para os lados, a humanidade cresceu em apetrechos e novidades piscantes, mas regrediu no sentir e no viver. Quem olha no seu olho quando se dirige a você? Quem faz aquilo que realmente causa palpitação e consome as horas? Quem pode dizer o que pensa? Quem pode pensar?

O buraco é bem mais embaixo e bem maior que nossa burguesia é capaz de permitir que imaginemos, meus caros! O trabalho vem nos adoecendo, nos atrofiando o corpo e a alma, suga um terço do dia diretamente e mais quantas horas de pré-ocupação?! Não há mudança real prevista, senhoras e senhores. Não há “se” ou “a menos que”. É isso o que temos. O movimento de mudança é lento, complexo e delicado, porque precisa ser sutil. Não estamos preparados para mudanças bruscas. Talvez seja essa a resposta à pergunta do título. As máscaras vão demorar a cair, e eu não tenho paciência! Não tenho diplomacia suficiente para esperar ou fingir. O que será de mim?

Ser ou não ser faz todo o sentido. O mundo do trabalho nos pede que sejamos isto ou aquilo, sem jamais nos permitir ser o que realmente somos. A especialidade está nos enlouquecendo. Ninguém mais sabe e todos sabem um pouco, e fragmentam o que sabem e, talvez, tudo isso se resuma em egoísmo.

É a necessidade de alimentar o ego que nos impele a vestir máscaras e querer máscaras nos rostos dos outros para que não tenhamos que tirar a nossa. No momento em que escrevo este texto minha mente tenta a todo custo me boicotar, dizendo que minhas palavras vão chegar aos ouvidos certos e pode haver retaliação. Bem diz o Chopra que vivemos reproduzindo as mesmas reações para todas as ações, sem nos darmos conta do instante.

Mas bem, se conviver com as diferenças significa aparar essas diferenças a fim de pôr todos no mesmo balde, eis outro dos tantos motivos para que o mundo do trabalho seja repensado, urgentemente, levando em conta o ser humano (oh, perdão, escapou!).

Perdoem a visão pessimista e as palavras inflamadas aqueles que acreditam no contrário ou foram levados a isso, mas correrei o risco de ser eu mesmo aqui.

2 comentários:

  1. Caro amigo, concordo com você nas entrelinhas que traz junto às tuas palavras, a distância entre nossa inteireza e a nossa própria vida.

    Talvez, considerando que o homem carrega consigo as sementes da angústia, do egoísmo, do medo, que se alimentam e se reforçam, desdobrando-se em outros vícios, defeitos e adjetivos frutos de sua sombra. Não é a ideia de Rousseau que o homem nasce bom e a sociedade que o corrompe.

    A história nos ensina, seja pelo sistema de livre mercado que nos encontramos ou nos sistemas estatais socialistas e comunistas, que a corrupção, a hipocrisia e a libido dominadii ali se encontraram. Os resultados sempre foram catastróficos. A utopia desenhada nos livros nunca se aplicou.

    Concordo que o mundo do trabalho, a dinâmica da vida imposta pela modernidade deva ser melhor analisado, mas... quais seriam as opções?

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  2. Não é pessimismo, é concreto. A vida se tornou isso, apenas o que se toca, o que não entra, o que não sorri, o que não sente, o que não sabe cuidar do próprio coração e desconsidera o do outro. São as inúmeras perguntas de falso interesse, do coleguismo sem amizade, e etc...

    Mas eu sei que se não fosse os meus amigos e familia, não suportaria viver. Todos em seus microcosmos encontram alguém ou algo para se apoiar, se não, ninguém estaria aqui.

    A questão é que a sociedade não tem quem a ampare.

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